Impacto Haiti 2017
Relatos de um sonho missionário...Por
Rev Cláudio Moreira
Uma lição prática do Evangelho
do Amor
“Aquele que sabe fazer o
bem e não o faz,comete pecado” (Tiago 4;17)
A
viagem missionária para a Base de Missões da Igreja Quadrangular
brasileira no Haiti começou no dia 1.º de fevereiro, quando
partimos de São Gabriel para Porto Alegre, mas teve seu início,
na verdade, muitos meses antes, quando o amor por Missões
começou a pulsar ainda mais intensamente em nosso coração. Sim,
já fazíamos missões exercendo o pastoreio, ganhando almas na
nossa própria cidade. E foi justamente pastoreando que começamos
a praticar a chamada “Missão Integral”, evangelizando através de
iniciativas sociais. Na igreja que pastoreamos em São Gabriel,
motivamos a igreja a evangelizar com distribuição de cestas
básicas, sopão comunitário, 30 Semanas de Oração pela Cidade, o
ônibus do Projeto Lucas em São Gabriel, e por duas vezes nossa
igreja hospedou missionários do CTMQ (Centro de Treinamento de
Missões Quadrangular). Fomos em busca de abraçar mais
intensamente este propósito, e tomamos conhecimento do Impacto
que seria realizado no Haiti em fevereiro. Com a publicação e
venda do livro “Em Águas Mais Profundas”, levantamos parte dos
recursos para as passagens, inscrição, passaportes e toda a
burocracia envolvida.
Fizemos o percurso primeiramente de São Gabriel pra Porto Alegre
no dia 1º de fevereiro, e de madrugada viajamos para São Paulo,
com uma breve escala em Curitiba. Do aeroporto de Guarulhos para
o Panamá, onde chegamos pela manhã, e de lá para a República
Dominicana. No desembarque, quase tivemos um transtorno com a
Imigração, que queria saber o endereço do hotel em que
ficaríamos em Santo Domingo, e que a gente ainda não sabia, pois
isso seria informado pela Base. Felizmente, quando mencionamos
que éramos missionários da Igreja Quadrangular, o oficial da
alfândega nos liberou. Lá, conhecemos o taxista enviado pela
Base (por sinal, também se chama Cláudio) que nos levou para um
hotel modesto no centro da capital dominicana. Lá, encontramos
as três jovens da cidade de Amambai, Mato Grosso do Sul, que
também fariam parte da caravana.
No dia seguinte, embarcamos em um ônibus e iniciamos a travessia
por terra rumo ao Haiti. Importante dizer que Haiti e República
Dominicana são dois países dentro de uma mesma ilha, com
população e costumes totalmente diferentes – o que fica bem
evidente quando chegamos à fronteira: saindo da República
Dominicana, um país caribenho muito bonito e moderno, e entrando
no Haiti, onde a miséria e a poeira muito branca saltam aos
olhos. Na aduana, nossas malas são revistadas por funcionários e
até por intrusos que andam por ali, à cata de algum favor
remunerado dos estrangeiros.
Atravessamos a estrada poeirenta rumo a Porto Príncipe,e
passamos a entender melhor o significado da palavra Haiti (que
em kreyol, se escreve “Ayiti” e significa “terras rochosas e
altas”. Montanhas e pedras para todos os lados. Praticamente não
há aquela boa terra negra que a gente conhece no Brasil, boa
para plantar de tudo um pouco. Nas ruas das cidades – todas elas
muito parecidas – a poeira predomina em ruas muito esburacadas e
sujas, com um trânsito caótico e desordenado.
Chegamos
na Base e fomos recebidos pelo Pastor Francisco, líder da Base
de Missões. Em seguida, o restante da equipe chegou pelo
aeroporto, e nos reunimos todos na base, localizada em uma bela
e grande casa de Pétionville, um dos bairros nobres do Haiti. É
ali que se concentram todos os programas missionários mantidos
pela Igreja Quadrangular brasileira em solo haitiano.
Tivemos aulas teóricas de história do Haiti, Mapeamento
Espiritual da nação, História da Base de Missões, e aulas de
Kreyol, ministradas pelos missionários. A pastora Ana Lúcia,
esposa do pastor Francisco, é, por assim dizer, o “coração” da
Missão. A base, além de prestar apoio à Igreja Quadrangular
haitiana, auxilia orfanatos e hospitais com alimentação, doação
de medicamentos, roupas, e acima de tudo, evangelização
missionária.
As tragédias que vitimaram o país,como a feroz ditadura dos anos
70, a Guerra Civil dos anos 80, o tsunami de 2010 e o terremoto
de 2015, deixaram muitos órfãos no país, instituindo um
verdadeiro “comércio”. No país, existem mais de 800
orfanatos,muitos deles mantidos por pessoas interessadas somente
nas doações. Na cultura haitiana, a criança é vista em último
lugar,e sua morte não chega a ser uma tragédia. A base de
missões atende apenas cinco orfanatos – e podemos dizer que, se
não fosse os missionários, as crianças destes orfanatos
provavelmente não teriam roupa nem comida.
Estivemos em cada orfanato com os missionários. E graças à
credibilidade deles no país, não tivemos impedimento de entrar
em hospitais mantidos por ordens religiosas católicas, como as
Freiras da Caridade, congregação fundada pela Madre Teresa de
Calcutá - e que, justiça seja feita, faz um trabalho
extraordinário no Haiti. Um dos orfanatos que visitamos,
funciona dentro de um Centro Vodu. Mas eles permitem a entrada
dos missionários, porque levam comida e roupas. Fizemos um culto
com as crianças no local, e foi um dos momentos onde pudemos
sentir a presença de Deus de forma muito forte. A imagem
daqueles pequenos indo às lágrimas enquanto louvavam ao Senhor
nunca sairá da minha memória.
As línguas oficiais do Haiti são o francês e o kreyol, uma
língua nativa que mistura influências do francês, espanhol,
inglês e da língua africana ioruba. Mas o francês só é falado
por quem freqüentou a escola, e mais de 55% da população é
analfabeta. Com algumas noções do idioma, conseguíamos interagir
com a criançada para os quais levávamos alimentos e roupas, e
também com os adultos.
Cada dia na Base, Deus falava conosco de maneira diferente – e
impactante, como o próprio nome sugere. A base foi convidada
pelo Batalhão Brasileiro da Força de Paz da ONU para participar
de um CIMIC, nome que os militares dão para as Cooperações
Cívico-Militares. O evento foi realizado em um hospital para
crianças especiais de Tabarré, uma cidade da região
metropolitana de Port-au-Prince. Nosso papel seria levar uma
programação cultural e artística, logicamente, enfatizando o
amor de Jesus.
Ao
chegarmos lá, vimos que, além dos soldados brasileiros, havia
também tropas das Filipinas, país insular de língua espanhola no
sudeste asiático, e Bangladesh, um país quase inteiramente
rodeado pela Índia. Realizamos as apresentações e depois oramos
com aqueles soldados. Tive a oportunidade de ministrar a Palavra
de Deus a eles, em espanhol, inglês e português. Aqueles
valentes soldados,homens e mulheres, choravam sentindo a
presença de Deus em suas vidas, e compreendiam o propósito
divino de sua missão.
Estivemos também na Sede Nacional da Quadrangular Haitiana, uma
igreja construída pela Quadrangular dos EUA. No mesmo terreno, a
Base de Missões da Quadrangular brasileira construiu uma escola
que atende 69 crianças da região, onde também funciona uma
cooperativa de costura onde mulheres haitianas confeccionam
uniformes escolares. No Haiti, o uniforme é obrigatório e custa
caro, o que cria mais um obstáculo para o acesso das crianças
haitianas ao ensino. Além de suprir esta demanda, as mulheres da
cooperativa aprendem uma profissão e tem a oportunidade de
geração de renda.
No domingo, levamos as crianças do Orfanato L’ison pra conhecer
uma linda praia do litoral. Foi um momento totalmente diferente,
quebrando a rotina de privação daquelas crianças, que brincaram
muito conosco, felizes.
Estamos na semana final, e já fizemos uma intensa programação,
com evangelismo na Praça Boyle, visita ao Centro Cultural
Brasil-Haiti, doação de medicamentos a uma farmácia mantida pelo
governo cubano no Cité Soleil (a mais perigosa favela do mundo).
A formatura se aproxima, e ainda temos muito a aprender. Mas a
lição maior, eu creio, já foi aprendida: por maior que seja a
adversidade, não existe lugar difícil onde Deus não possa
produzir milagres. E o sorriso de cada haitiano que luta
bravamente contra a fome, a doença e a violência, certamente é
um grande milagre.